Se um dia eu imaginasse, ao longo desses últimos anos, que o filme que me levaria a retomar este blog (sendo retomar uma palavra bem deslocada, considerando que é apenas uma postagem, depois de um longo tempo), nunca cogitaria que seria um reboot da franquia CORRA QUE A POLÍCIA VEM AÍ. Mas, sinceramente, até que faz sentido.
Pare pra pensar: há muito se observa uma grande decadência das comédias nas salas de cinema; um gênero cuja parte do sucesso vem através do exagero e dos riscos da ofensa, acabou afundando no tsunami politicamente correto que abarcou o mundo todo, atingindo, principalmente, o mundo do entretenimento. Óbvio que o humor ainda estava presente em vários filmes, mas você consegue se lembrar da última pura e simples comédia que, porventura, você tenha assistido numa telona?
Procurando deixar quaisquer narrativas de lado, minha impressão pessoal é de que a comédia andou muito tímida ao longo dos últimos anos. Existia, naturalmente, o humor, numa penca de filmes, mas o besteirol puro e simples, sem amarras, daquele tipo que te deixa constrangido, chocado e chacoalhando o corpo com risadas - realmente não me recordo do último grande lançamento nesse estilo.
Por isso, até que faz sentido eu sair do meu comodismo, preguiça e procrastinação para dizer que eu me diverti bastante com esse reboot. Bastante mesmo!
Veja bem, não é um filme perfeito e tem alguns momentos realmente esquisitos e constrangedores num sentido ruim para comédias (quando só é esquisito). Mas eu não posso deixar de celebrar o esforço em se buscar aquele mesmo espírito anárquico, as piadas imbecis e até uma porção de tiradas inteligentes e homenagens bem sacadas (como a cena em que os personagens atuais - filhos dos personagens da trilogia original - fazem uma homenagem aos seus pais numa espécie de altar dentro da delegacia, incluindo uma esperta referência ao personagem interpretado pelo O. J. Simpson no passado).
Outro trunfo é a escalação de Liam Neeson como Frank Drebin Jr - ele está ótimo no papel, mantendo a cara séria que o Leslie Nielsen fazia e tornava tudo mais engraçado. No caso do irlandês, o fato de estarmos tão acostumados com ele fazendo papel de vingador inclemente torna hilário vê-lo falando bobagens sozinho dentro do carro da polícia ou sofrendo com uma dor de barriga quando aborda um suspeito no trânsito. Além disso, se tem uma coisa que eu gosto nesse filme são os diálogos cheio de duplo sentido - imagino que realizar a dublagem de um filme assim seja bem complexo.
Também gosto muito das performances de Pamela Anderson, Paul Walter Hauser (surpreendentemente contido) e Danny Huston (ator pouco lembrado em conversas cinéfilas e sempre muito eficiente nos seus papeis). Minha impressão é de que todos eles conseguiram entender o tom de atuação numa comédia desse naipe - não são necessárias caras e bocas, porque os diálogos e as situações já são "nonsense" o suficiente.
E por falar em "nonsense", preciso comentar sobre o ponto que menos me agradou no filme: seu ritmo. Pra começo de conversa, os oitenta e cinco minutos do filme são um alívio num mundo onde uma grande parcela dos maiores lançamentos ultrapassam, desnecessariamente, as duas horas de duração. Contudo, em CORRA QUE A POLÍCIA VEM AÍ temos uma bizarra sequência envolvendo um boneco de neve que, mesmo durando parcos cinco minutos, é tão deslocada e estranha que afeta consideravelmente a pegada do filme. A partir dela, há alguns lampejos de boas ideias, mas o filme parece literalmente correr (perdoem o trocadilho) para a resolução do plano boboca do vilão (que não faz o menor sentido e é requentado de outras obras, como o primeiro Kingsman).
Mesmo assim, o saldo é positivo. Precisamos de mais filmes como CORRA QUE A POLÍCIA VEM AÍ. Precisamos rir mais, precisamos do exagero de Hollywood, de atores que não se levam tão a sério, de riscos narrativos; talvez eu esteja exagerando ao considerar um reboot como um projeto de risco, mas no mundo atual de ofendidos de plantão, há alguma coragem em resgatar um besteirol clássico. Adoraria ver uma continuação deste aqui.








